quarta-feira, 28 de novembro de 2007

A culpa não é do usuário


Em muitas análises escritas e conversas, vejo a mesma opinião sobre Tropa de Elite: a culpa é de quem consome a droga. Não assisti ao filme. Não é preciso vê-lo para entender o que acontece nos morros e periferias do país. Aliás, nada que José Padilha mostre em sua obra mudará minha opinião: entrar no morro assassinando pobres, além de desumano, é crime; fumar maconha é uma decisão pessoal que deve ser respeitada.

Da mesma maneira que deve ser respeitada a de quem decide tomar pinga ou cerveja. E difícil entender a contradição dos fatos. O álcool, que destrói famílias e mata nas estradas, é legalizado e até incentivado. Exemplificando, o que ocorreu quando o álcool foi proibido nos Estados Unidos, durante a famosa Lei Seca? Contrabando. Ou seja, a demanda existe para ambos, a proibição é que gera a criminalidade.

Acreditar que o fim do consumo de drogas acabaria com o crime é uma visão simplista e hipócrita. É apontar o dedo para os mais fracos com o intuito de manter o status quo. Mas, até então, nenhuma novidade para pessoas que idolatram torturadores. Há muito tempo a sociedade trata a questão com uma falsa moral absurda. Ao mesmo tempo em que criminaliza jovens usuários, faz vista grossa para os muitos artistas e músicos que usam a maconha para aumentar a percepção e estimular a criatividade.

Aumentar a percepção e estimular a criatividade? Sim, pois esses são os verdadeiros efeitos da cannabis. Muitas obras de arte foram criadas com seu estímulo. Por muito tempo, usada como terapia medicinal. Em outros casos, o uso de drogas é uma tentativa de fugir da realidade cretina em que vivemos. Tentativa válida, porém perigosa.

A desigualdade empurra crianças para o crime. Textos e mais textos são fabricados sobre violência, mas será que ninguém parou pra pensar no outro lado? A sua influência de sucesso foi um médico, advogado ou jornalista. O de um moleque na favela, o dono da boca. Você se esforça para entrar em um sistema educacional falido e excludente. O moleque é o excluído.

Entre penar na escola ou ganhar dinheiro fácil no tráfico, qual sua escolha? Lembre-se que você tem dez anos, mora em um barraco com sua mãe e seus irmãos e não tem mínima noção do que é certo ou errado. Mas, se parar alguns minutos e fizer uma reflexão, pode descobrir que a culpa também não é sua. Sem nenhum direito e renegado. Não sabe o motivo de tanto medo e preconceito. Na maioria das vezes morre antes dos vinte, sem nenhuma resposta. E ainda tem quem aplauda.

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